20 setembro 2011

CONTROVÉRSIA BÍBLICA



Há, atualmente, uma grande controvérsia nos meios eruditos (e em algumas instâncias não tão eruditas assim) acerca dos textos utilizados para se comporem as traduções do Novo Testamento para o vernáculo. Liberais e fundamentalistas digladiam-se apaixonadamente, muitas vezes sem qualquer caridade de ambos os lados, aqueles querendo impor o Texto Crítico (TC), estes outros defendendo o Texto Recebido (TR).
TR e TC representam duas vertentes distintas, uma tradicional (TR) e outra moderna (TC), também chamadas, respectivamente, de Bizantina e Alexandrina, em razão de sua origem: a Bizantina, no mundo grego, e a Alexandrina, no Egito.
Já ouvi uns e outros dizerem, por um lado, que o TR é um texto “abominável”, “diabólico”, e, por outro, que o TC é “maligno”, “distorcido” e que ele “diminui” as verdades bíblicas fundamentais, entre elas, a própria divindade de Cristo.
A bem da verdade, segundo os especialistas, ambos os textos concordam em cerca de noventa por cento e as diferenças, em grande parte, referem-se a aspectos secundários, que não envolvem ensinamentos cruciais. E na maioria das ocorrências, uma verdade fundamental é omitida ou “distorcida” em alguma passagem, mas afirmada em outra.
Por exemplo, em Mateus 1.25, as Bíblias baseadas no TC dizem que a virgem deu à luz “um filho”, enquanto que as baseadas no TR grafam: “filho primogênito”. É óbvio que há uma disparidade muito grande entre Jesus ser apenas filho de Maria e ser seu filho primogênito. As consequências para a afirmação ou não da virgindade perpétua de Maria são claras em ambos os textos. Mas isto não quer absolutamente dizer que o TC tem deliberadamente esta ou aquela intenção, pois o mesmo TC, em Lucas 2.7 registra: “filho primogênito” (vide ARA e NVI, por exemplo).
Outro exemplo: 1 Timóteo 3.16. As Bíblias do TC dizem: “Aquele”, enquanto as do TR trazem: “Deus”. A NVI, embora no texto registre “Deus”, remete a uma nota de rodapé, que afirma: “Muitos manuscritos dizem Aquele que”. Para os adeptos do TR, a substituição de “Deus” por “Aquele”, ou mesmo a nota de rodapé, seriam uma ação deliberada dos revisionistas contra a divindade de Cristo. Mas o fato é que em muitas outras passagens, o TC afirma claramente a divindade do Senhor: Rm 9.5; Jo 1.1; Hb 1.8; 1 Jo 5.20; etc.
Pessoalmente, creio na inspiração verbal da Bíblia e na sua inerrância e infalibilidade e estou convicto de que o Texto Recebido é a expressão exata do que registraram em seus autógrafos os escritores do Novo Testamento, sob a inspiração do Espírito Santo. Entretanto, não tenho muitos problemas com o Texto Crítico e não acredito que quem lê apenas o TC deixe de ter acesso à genuína Palavra de Deus. Explico.
É parte da história que durante alguns séculos os cristãos primitivos de um modo geral foram privados do inteiro teor da Palavra de Deus escrita. Não havia Bíblias como hoje; era muito difícil e caro conseguir uma cópia de algum texto bíblico. De fato, nem mesmo havia sido definido oficialmente o cânon das Escrituras, o que só ocorreu no Concílio de Hipona, em 393 d.C, sendo confirmado no III Concílio de Cartago, em 397.
Mesmo assim, as pessoas se convertiam e conheciam a Palavra de Deus. Como isso era possível? Correndo o risco de simplificar demasiadamente a resposta, mas devido ao tempo e espaço exíguos, afirmo o seguinte:
A Bíblia é a Palavra de Deus escrita. Os originais foram escritos em hebraico, aramaico (VT) e grego (NT). Não obstante a inspiração do Espírito Santo, essas línguas são humanas e não podem expressar completamente o que Deus é, o que Deus faz e o que Deus quer. Qualquer afirmação em língua humana acerca de Deus torna-se uma abstração, uma redução do que Deus é, faz e quer.
Não é que as Escrituras não sejam perfeitas ou inspiradas por Deus; elas o são! Entretanto, por estarem decodificas em linguagem humana, elas só transmitem o que pode ser apreendido através das limitações próprias dessa linguagem. Uma compreensão completa da Palavra de Deus requer algo mais.
É por isso que quem lê a Palavra de Deus apenas com o intelecto, utilizando-se tão-somente das regras gramaticais, nada consegue entender. Assim o afirma a Palavra divina: “Ora, o homem natural não compreende as coisas do Espírito de Deus, porque lhe parecem loucura; e não pode entendê-las, porque elas se discernem espiritualmente. Mas o que é espiritual discerne bem tudo, e ele de ninguém é discernido.” (1 Co 2.14-15).
Por outro lado, Jesus é a Palavra de Deus em pessoa, divina Pessoa. Em nossa conversão, essa Palavra-Pessoa vem habitar em nós. Com esta presença e unção, não precisamos que alguém nos ensine, pois ela nos ensina – intuitivamente, melhor, misticamente – todas as coisas (1 Jo 2.27).
Assim sendo, de certo modo, tanto faz ler o Texto Recebido ou o Texto Crítico, ou mesmo ser privado da leitura, por ser analfabeto ou por opressão de algum regime político. A Palavra-Pessoa em nós – Cristo em nós – faz-nos discernir o que é e o que não é a Palavra de Deus, pois todo o conteúdo das Escrituras, e muito mais: aquilo que ultrapassa os limites da linguagem humana, habita em nós através da Palavra-Pessoa. E o mesmo Espírito que é a Palavra, e que também é Pessoa, e que inspirou a escrita da Palavra, inspira a nossa compreensão, para que saibamos com certeza o que Deus é, o que Deus faz e o que Deus quer.
Lembremo-nos do que disse a própria Palavra-Pessoa e que ficou registrado como Palavra escrita: “Se vocês permanecerem em mim, e as minhas palavras permanecerem em vocês…” (Jo 15.7). Pemaneçamos, pois.

+Bispo José Moreno
Igreja Anglicana Livre

12 setembro 2011

Publicado primeiro livro de Haroldo Mendes
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